domingo, 19 de julho de 2015

Capítulo I

     "Mas não precisamos saber pra onde vamos
Nós só precisamos ir" - Engenheiros do Hawaii


     Garganta fechada, narinas entupidas, olhos vermelhos e doloridos. Não, não estou doente. Estou chorando. E falando nisso, não sei o motivo ao certo. Mas tudo o que vem acontecendo contribuiu para isso. Como uma gota a mais faz um copo cheio transbordar.  Nunca fui muito de chorar, embora admita que certas dores saram mais rápido se acompanhadas por uma bela noite de choro.      Ops. Acho que me expressei mal. Como uma noite de lágrimas pode ser bela assim? Ficar com o aspecto de doente não é nada atrativo. Eu sei bem disso. Sempre tento controlar essas crises de sentimentos. Não é legal ver alguém chorando. Nunca sabemos o que dizer, pelo menos algo que não soe piegas.
     Então, aqui estou. Sentada no chão do meu quarto, com a camiseta encharcada enquanto espero as vozes se acalmarem na sala. Ou o meu coração voltar ao tamanho real. Porque tudo precisa ser tão complicado?
- Liyzie, venha. – diz a mulher que costumava ser a minha mãe do batente da porta.
     Como sempre, obedeço. Encontro-me parada entre as duas pessoas. Pressinto que não gostarei da notícia que os meus pais me darão.
- Como você sabe, -começa meu pai- nós nunca chegamos a um acordo sobre nada referente a você. Bem, isso não foi diferente. Nós dois não queremos abrir mão de estar contigo, querida, por isso achamos melhor que você vá para uma cidade na metade da distância entre as nossas. Assim você pode alternar no seu tempo vago.
-E nós também poderemos visitá-la sempre- completou minha mãe.
     Aquele sorriso acolhedor que me lançou não surtiu o efeito desejado. Essa é realmente uma péssima notícia. Não pelo fato deles me mandarem para uma cidade estranha sozinha, mas por eles terem concordado nisso. Talvez estejam me tirando de suas vidas. Afinal eu sou a pedra no sapato deles. Quem sabe se não foi por minha causa que eles se separaram. Ou talvez tenha sido porque eles não deram certo mesmo. Tão diferentes...
- E então? O que você nos diz?- quer saber meu pai.
     Sei que não adianta falar nada. Porque discutir se nunca me ouvem? Minha vida está uma bagunça e não tenho o poder de arrumá-la. Então balanço a bandeira branca ao dizer:
- Ok.
     E mesmo com os olhos ardendo em um misto de raiva e dor, olho para eles naquele momento. Afinal eu os amo. E isso pode mudar, assim como eu estou. Dou um pequeno sorriso e saio da sala. Preciso de um pouco de ar.
     Na varanda percebo que tudo o que eu entendia por minha vida está sendo alterado. E eu não tenho tempo de aproveitar o que ainda me resta e lamentar pelo que não terei.

     Por isso, concentro-me na primeira ideia: tenho que aproveitar essas últimas três semanas que me restam aqui para rever algumas histórias. Uma vez que não posso começar do zero em outro lugar sem por um ponto-final aqui. E é certo que tenho alguns porquês ainda sem resposta. Mas isso é uma questão de tempo, não é mesmo?

domingo, 12 de julho de 2015

Prólogo

        
     Azul, azul lunar. Assim está o céu, da mesma cor da blusa de lã que estou usando. É estranho pensar em coisas tão banais como essa. O que importa a cor do céu? Sei que provavelmente não é para lá que irei mesmo.
     Um zumbido soa ao longe. Percebo que são as minhas bolhas de ar que acabaram de emergir. Na verdade, o zumbido é bom. Um barulho naquele lugar tão calmo. Um lembrete de que ainda estou viva. Isso e o frio que me dá pontadas de dor nos ossos.
     Conforme o tempo passa, o ambiente escurece. Lembro-me, então, de como eu amo a noite, a sua escuridão e aquele satélite prateado que me lembram das íris dele. Dois poços de puro preto, mas com um brilho morno no fundo.
     Eu estou no fundo, mas aqui não há brilho, nem som. O restante de ar que havia em meus pulmões escapou segundos atrás em bolhas alegres no seu voo à superfície. E eu sei que o fim está próximo.
     Então, as enormes palmeiras acima de mim perdem, gradativamente, a cor, o foco, a vida. Assim como eu.